domingo, junho 19, 2005

Elegia a uma aberração

Eis que se viu na infeliz placenta
Um feto, um pedaço de gengibre
Cujo crânio superava o calibre
Da fenda vaginal da macilenta

Talvez no choque do osso com o osso
Voltasse para dentro da mãe tísica
E até zombando das tais leis da Física
Fosse expulso no intestino grosso

Mas como todo pobre metediço
Não deu ouvido a qualquer queixume
E reduzindo seu cruel volume
Passou estreito e se tornou maciço

Num forte espasmo, eis que entrou no mundo
Aquele platelminto meio humano
Que enxugado num humilde pano
Foi decretado como moribundo

Era o resumo do feio e do horrendo
E besutando na escória cálida
Louco soltou-se do umbigo da esquáilida
Contra o destino, foi sobrevivendo

Destarte, começa o destampatório
E se indaga se a aberração
Merece ter direito a vida ou não...
E o que é da mãe no pós-operatório?

Então, dá-se início ao escrutínio
O cume e a glória da democracia
Todos os votos contra a covardia
Exceto um, a favor do assassínio

A criatura cresce, entra na infância
Naturalmente lhe nasceu um buço
Que lhe tornou até mais inconcusso
Na senda da feiúra e da ganância

A criançada toda o insulta
Entre troças, moteos, caçoadas
Chacotas, desfrutes e surriadas
Chega o monstrinho à idade adulta

Coitado afunda-se nas estultícias
Natuais, mas no caso excessiva
Como houvesse algum demo que motiva
A busca libertina por patrícias

No entanto, nenhuma das desejadas
Mostrava-lhe um pouco de luxúria
Até que ele confessou com fúria:
"Eu não sei cortejar nas patuscadas!"

O modo que achou em sua gaveta
Empós a tão plangente confissão:
Procurar na patota um bom ladrão
Pra servir de amigo e proxeneta

As moçoilas não se submetiam
À libido insaciável do ser
Que só tinha na mente o prazer
E nada mais os neurônios viam...

Não se abateu ante ao insucesso
Decidiu visitar um alcoice
Envergonhado, o diferente foi-se
Com seus passinhos de um réu confesso

Não esperava que em seu porvir
Quando ele chamou uma rameira
Pra trabalhar com sua parceira
Sexual, tivesse de ouvir:

"Não pecúnia no mundo que pague
Esse nojo de dividir a cama
Como esse infeliz que a mim me chama...
Antes prefiro a morte e o azorrague!"

E fez convicto a derradeira escolha
Tomando em suas mãos o escalpelo
Rompeu a artéria com tamanho zelo
Que feneceu suave com a folha...

Houlenn ola

Ontem o padre foi a minha escola
Linda estava a tua estola
A todos nós, ele nos deu esmola

O Zezinho pôs tudo na sacola
Luizinho me pegou pela gola
Aí me roubou e quase me esfola

Olha o José ali jogando bola
Lá o Luís está cheirando cola
Aqui estou eu preso na gaiola

Onde eu sou o covarde sem mola
Lugar onde a angústia sempre me assola
Assim como um náufrago na marola

terça-feira, junho 07, 2005

O que farias, moça?

Tu estavas tão louçã
Que eu não achei por mal
Aumentar teu cabedal
Com uma libra de avelã

Não imaginei que ias
Se portar de tal maneira
Que plantasses bananeira
E pulasses de alegrias

Quando forte me beijaste
Minha boca estremeceu
E senti no beijo teu
O crescer de minha haste

Então pensei: sou um vate
E o que tu, moça, farias
Se te doasse poesias
E caixas de chocolate?

Desculpas pela autoria de poema

Certo dia falei da emoção
Desculpe o poeta emocionado
Se algo modifica seu estado
Não se utiliza da sua razão

Mas hoje, com minha tão sóbria mente
Penitencio a mim mesmo por
Ter proferido com tamanho ardor
Afirmações de forma veemente

Eis que resolvo permutar então
O meu excesso pela inteligência
E o que disse com a veemência
Por uma sóbria interrogação

O que é melhor levar para o banheiro:
Um fuzil automático e leve,
A consciência de que nada deve
Ou a guitarra do Kiko Loureiro?

Erros aceitos

Tenho errado muito ultimamente
Também queria só voltar atrás
Pra corrigir todos os erros tais...
Não é possível isso atualmente

Então, contento-me em haver errado
E me arrependo do que eu hei feito
E bem sabendo que não sou perfeito
Eu lanço os erros todos pro passado

Faço a limpeza da minha consciência
Já que não há mais pra fazer
Mesmo se eu não cumpro meu dever
Errar faz parte da nossa vivência

Anelo paterno

A vida miserável de rotina
Que o bom Deus do céu me concedeu
Tornou-me racional e quase ateu
Digo quase por causa da menina

Que gerei e hoje tão pequenina
Há de ter o sonho de ir pro céu
De ter seu príncipe no himeneu
E habitarem juntos a colina

Como pai, eu só tenho um escopo
Na praia, tomando água de côco
Contar algumas fábulas de Esopo

E se ela achar que ainda eh pouco
Lhe levar a colina, até o topo
Matar dragões, príncipes e ser louco!

As loucas do Milênio

Eu tenho várias cunhadas
Que contam suas lorotas
Que andam sempre janotas
Esbeltas e perfumadas

Moças até engraçadas
São motivos de anedotas
De jocosos e de frotas
São donzelas bem amadas!

Todas elas têm um gênio
Tão forte e enigmático
São as loucas do milênio!

Eis um fato problemático:
Elas são um nitrogênio
No meu anel aromático

Matricida cibernética

Desempoando o protocolo crasso
Qie encrimina um certo matricida
Um criançola que em minha vida
Foi a figura do mostro e do lasso

Em outro alguém eu nunca vi um traço
Daquela criatura horrenda e ungida
Por óleos bem modernos na partida
Exercitando só o dedo e o braço

Rompendo com o que se chama ética
Buscando a todo custo me vencer
Entrou em minha sala quase hermética

Entrou por fios, entrou sem eu o ver
Tornou-se matricida cibernética
Matou a placa-mãe do meu PC