domingo, dezembro 25, 2005

As aventuras de Carlos Marques e Frederico dos Anjos na Vila dos Caetés

Lembro-me de quando Vila dos Caetés – uma bucólica cidadezinha cheia de árvores e quietude ­– foi transformada por um fato insólito, ou melhor, dois: o nascimento de Carlos e Frederico. O pai dos gêmeos, dotado de escassa beleza, foi eufórico regozijar-se com um amigo:
– Eles são muito parecidos comigo, eles são a minha cara!
– Deixe isso pra lá, o importante é que nasceram com saúde.
Sem entender a ironia devido à intensa felicidade, Hamilton Marques foi comunicar a todos sua opinião sobre a aparência dos filhos. O velho Afonso, avô dos línguas-de-trapos, decidiu permanecer em casa. Não gostava de nada que modificasse seu cotidiano, nem festas, nem revoluções. Passava o dia lendo romances, escrevendo alguns sonetinhos e falando expressões populares as quais ele tratava de transladar para seu português rebuscado.
Na manhã do dia seguinte, Hamilton recomeçava o trabalho. Ele vendia tudo, do alfinete ao foguete. Sempre conseguia persuadir os habitantes de Vila dos Caetés com suas ofertas, até mesmo clientes do tipo carne de pescoço. Frederico e Carlos, desde bem tenros, já demonstravam que não iriam ser meninos calmos. Urinavam em todos que lhes punham nos braços. Assim que adquiriram os primeiros dentes, resolveram morder os prestativos seios maternos. Trepavam em todos os móveis da casa. Não paravam quietos. Moleques buliçosos.
Aos oito anos, começaram a andar em cima de tábuas com quatro rodinhas. Eles eram assunto obrigatório em todas esquinas, principalmente na de dona Carolina, mexeriqueira oficial da cidade. Iam de um lado a outro da minha velha Vila dos Caetés gritando e fazendo estripulias. Isso ainda era suportável para a maioria dos habitantes, porém, quando começaram a escutar em volume excessivo um barulho que eles chamavam de Hardcore, as reclamações exasperadas começaram a bater na porta do senhor Hamilton Marques. Moleques buliçosos. Dona Maria dos Anjos, mãe dos traquinas, ousava embalde defendê-los:
– Isso é música.
Não obstante meus conhecimentos musicais se restringirem a Fagner e Belchior, sempre soube que aquilo não era música. Certo dia, várias gomas de mascar usadas estavam grudadas em minha porta e nas de vários vizinhos meus. Tínhamos certeza: era mais um ato de Carlos Marques e Frederico dos Anjos. As reclamações aumentaram. Os pais, enfim, notaram que havia algo diferente com aqueles dois. Eu, sinceramente, achava que aquela era a hora desses guris apanharem como boi ladrão. Quando alguém perguntava ao velho Afonso sobre seus netos, ele respondia rudemente:
– Solução para aqueles dois? Adestrar, porque educar não resolve.
Era um idoso beduíno, entretanto sempre o achei o mais sensato daquela casa. Os meninos estavam crescendo e adquirindo cada vez mais berliques e berloques. Quando apareceram frases escritas com tinta vermelha nos muros da cidadezinha, era líquido e certo que havia sido mais uma traquinice da dupla. Moleques buliçosos. Diante disso, o velho sábio advertiu:
– Podem retirar o filhote de eqüino da perturbação pluviométrica, esses meninos nunca vão tomar juízo.
– Papai – falou o ingênuo Hamilton – eles vão mudar. Eu vou conversar seriamente com eles e eles vão mudar.
– Isso não passa de prosopopéia flácida para acalentar bovinos...
Afonso já estava lânguido, não levantava nem falso testemunho. Com seus passos de cágado foi até a cozinha. Abriu a geladeira que estava qual boate: apenas luz e fumaça. Ao reclamar de tamanha inópia, caiu morto no chão. Foi estudar a geologia do campo santo. A família já esperava a ida daquele ser de comportamento imarcescível. Dona Maria dos Anjos chamou um padre para celebrar a missa. Enquanto divagava como bola sem manicla, pensou se o sacerdote que ali estava não poderia melhorar a inquietação de seus filhos.
Logo que a celebração eucarística acabou, a mãe dos gêmeos combinou a visita dos filhos àquele homem de Deus. Frederico dialogaria com o padre na hora do almoço, Carlos faria o mesmo na boca da noite. Ao saber do compromisso meio religioso que teriam, comentaram:
– Padres só servem para serem enterrados e observarmos se daqui a mil anos virarão petróleo.
– “Para padres não há razão, há cadeia”.
Mesmo assim pensando, Frederico estava na igrejinha pontualmente ao meio-dia. O sacerdote era um tanto austero, impunha respeito. Possuía um método próprio para tentar solucionar problemas dessa natureza. Mandou o menino sentar-se em uma cadeirinha branca no centro da sacristia. Olhou-o no fundo dos olhos e indagou:
– Onde está Deus?
Obtendo somente o silêncio como resposta, tornou a perguntar, agora em um tom mais agressivo:
– Onde está Deus? Diga-me onde está Deus!
Frederico foi tomado pelo medo. A boca aberta não conseguia pronunciar palavra alguma. Correu. Ofegava e, ao encontrar seu irmão, alertou-o:
– Parceiro, desta vez é um caso sério.
– Que houve, parceiro? Que houve?
– Cara, Deus sumiu. E adivinha em quem que eles estão colocando a culpa?
Decidiram, pois, fugir. A última notícia que tive deles é que estavam fazendo suas travessuras na Rússia. O certo é que a cidadezinha bucólica sofreu uma metamorfose maior que a daquela personagem de Kafka, Gregor Samsa. É incontroverso: Carlos Marques e Frederico dos Anjos, moleques buliçosos, revolucionaram a Vila dos Caetés.

Empréstimo dispendioso

Enquanto eu vivia a angústia de um jogo de xadrez, uma pessoa aparentemente comum se aproximou do tabuleiro. Cumprimentou meu adversário e falou-lhe a respeito de umas certas cartas de Paulo de Tarso. Assunto chato. Diante daquela boca pronunciando palavras de fé e alienação, veio-me um sentimento estranho o qual me afetou de tal forma que em menos de um minuto venci a partida. Apertei a mão de meu êmulo como de praxe tentando esvaziar-me debalde da empáfia que sempre me adentra quando ganho. Não consegui. Decidi, então, tentar mudar as atividades nas quais o recém-chegado utilizava seu tempo: em vez da mão lenta a passar as páginas da Bíblia, o dedo firme a movimentar peças. Empós de mais um confronto enxadrista, emprestei-lhe o xadrez de vidro, dado a mim por meu pai em meu aniversário de oito anos, junto a um livro básico.
Entrementes que agradecia, acendia um cigarro. Saiu cabisbaixo, fumando, pensando. Xadrez, bíblia, nicotina. Começamos a jogar de quando em vez e ele nunca conseguia me superar. Ele leu outros livros, quebrou o rei, colou-lhe os fragmentos, tentou derrotar-me por dois meses, desesperou-se e, por fim, suicidou-se. Não sei e creio que nunca saberei ao certo se essa sua última atitude possui alguma relação íntima com as anteriores. Os familiares escolheram a depressão, doença da alma, como bode expiatório.
Não me importei muito se os apreciadores de Émile Durkheim considerariam este ato um suicídio egoísta, altruísta ou anômico; porém fiquei interessado nos pensamentos últimos de um suicida. “Em que pensa o homem-bomba no exato momento de soltar o pino e estancar o tempo?”, já interrogava Mário de Sá-Carneiro que também terminou com a própria vida em 1916. Em que pensa o nazista antes de ingerir uma cápsula de cianureto? Em que pensa o terrorista antes de jogar um avião contra uma torre americana? Em que pensa a menina mal-amada antes de cortar os pulsos? No calor dos cigarros velhos daquele ledor da palavra de Deus, começavam a derreter minhas asas de cera e de certezas.
Camus anunciou: “Só há um problema filosófico verdadeiramente sério: é o suicídio. Julgar se a vida merece ou não ser vivida, é responder a uma questão fundamental da filosofia”. Essa caixa de Pandora dentro de um universo que é você mesmo desafia gregos e troianos. Não é tão fácil romper propositalmente essa fina película que está entre o mundo da fumaça, das correrias, das contas de água e luz e o mundo do céu, do inferno, do invisível e – quem sabe? – do inexistente. E quantos já se decepcionaram! Imagino algumas vezes alguns ateus ajoelhados suplicando perdão a São Pedro e outras vezes, alguns santos que doaram à vida por Cristo se transformando em mero pó. O maior medo que possuo agora é que o Zyklom B da dúvida acabe me matando (ou me suicidando).

quinta-feira, dezembro 15, 2005

Vagas, Plagas e Sorvetes

[Em desabafo a uma amiga desconhecida, ou não.]

Vai... Abandona esse amigo...
Vai pelas plagas mais longíquas
Se esvai como o sal nessa procela
Vai, que a nau não te espera para começar essa viagem
Vai pelas vagas nem sempre tranqüilas
Vai, deixa o amigo..
Deixe o amante que te aguarda
Mas não deixe o sorvete derreter...

segunda-feira, dezembro 12, 2005

Porque: - Angélica, não traga.

[...] Bêbada e ridícula, Angélica se entregou ao sexo oral. A tecnologia a serviço do demônio, pois coisa de Deus não havia de ser: Sony Cybershot 5.1 megapixels e Internet.
Depois de uma semana, toda a juventude do Jardim São Tomé e da Escola Nossa Senhora das Dores tinha as malditas fotos salvas em alguma pasta, escondida ou não, dos seus computadores. E o que era Angélica agora? Angélica não era Angélica, não era nada. Angélica era Gegel, Gegel Bola-gato, da Festa do Leonardo e das fotos na Internet.
Um desespero forte que pode fazer cortar os pulsos dominava Angélica. Rejeição, desprezo, desdém, motejos: esse era o novo mundo da princesinha do Ray-Ban, agora meio enferrujado com as lágrimas. Os olhos puxados não agüentavam mais chorar e o lábio era morto, calado, sem vida, sem batom, sem palavra.
Procurou seus cigarros. Mas pra quê? Não era vício, era moda, era um modo. Um modo de se aproximar dos mais velhos, de parecer mais velha, de ser superior, de ser notada. Não fazia sentido mais. Tanta carência de afeto...
- E o diabo desse menina não tem mãe, não?
Ter, tem, mas é como se não tivesse. Trabalha e namora muito, mal fica em casa. Angélica pegou de seus cigarros e do isqueiro e desatou a andar pela rua queimando-os. Sentado na calçada, lendo uns poemas de Manoel de Barros, seu Augusto aconselhou:
- Menina, não trague mais esses cigarros, não...
- Eu não trago mais.
- Pois você faz é bem. Olha que esses tragos só fazem mal pra gente.
- Eu sei, seu Augusto.
E após uma pausa e um olhar para si mesma, ela repitiu convicta:
- Eu sei...

sábado, novembro 19, 2005

Porque Angélica não traga

Um conto de porte médio, por isso, postado em 2 partes.
Recomenda-se a leitura do conto "A hora e vez de Augusto Matraga", de Guimarães Rosa no Livro Sagarana

- Angélica, não traga.
Mas ela trouxe. Angélica, teimosa, trouxe seus cigarros para a festa de 15 anos de Mônica. Trouxe também um isqueiro, daqueles prateados, quadrados, com tampa. Aqueles lábios com batom rosa e um cigarro aceso incomodavam:
- E o diabo dessa menina num tem mãe, não?
Tinha 12 anos e um celular no bolso da saia. O cigarro tratou de apresentá-la à Renata e a todo o 3º ano da Escola Nossa Senhora das Dores. Não queria amizades com as crianças da 6ª série. Bando de lactantes: eles ainda jogam Banco Imobiliário.
E na festa de Mônica, Renata também apareceu.
- Angel, me passa um careta, fazendo o favor.
- E você fuma, Renata?
- Ah!, Mônica, eu fumo, mas não trago... Quem traz é a Angélica...
O sonho de todo garoto da Escola era ser amigo de Angélica. Os olhinhos puxados sempre escondidos atrás do Ray-Ban de lentes verdes. Ele era linda, tinha o corpo imaturo, o aspecto infantil.
- Angélica, posso conversar contigo?
E após uma pausa e um olhar de desdém:
- Não.
Um não sereno como uma facada lenta em um corpo adormecido - perfura a alma. De fato, a tristeza sempre vinha acompanhar por, pelo menos, três dias os que tentavam uma aproximação. Para as outras meninas restava a inveja.
Como os pais de Leonardo tiveram de viajar e a oportunidade que faz o oportunista, uma festa foi planejada. Todos os patuscos do 3º ano iriam e Angélica era a princesinha no meio deles. Vodka, Rum, Sukita, Coca-cola e cachaça. E várias esfirras do Habib´s porque eram baratas. Bêbada e ridícula, ... ... ...

Onde estão meus chinelos?

Minha primeira redação com conceito "E" na Escola
Recomenda-se a leitura do conto "O Relógio de Hospital", de Graciliano Ramos

A vontade do homem é ilimitada, mas a condição humana impõe seus interditos deixando-o em conflito permanente. Ele sempre quer mais, quer ir além, "plus ultra"; no entanto, está submetido a leis naturais e regras que não permitem sua ascenção infinita.
A Baleia, personagem de "Vidas Secas" e protagonista do conto que deu origem ao romance, é humanizada na medida em que sente desejos, sonha com uma realidade melhor para si. Esta é a característica humano maior: não se contentar com o que possui.
A vida humana, porém, não é suficiente para se alcançar todos os sonhos. A morte, a doença, o medo e, nos tempos atuais, até a condição financeira impossibilitam o ser humano de realizar seus anseios.
Assim, vendo-se limitado e querendo superar esses limites, ele cria a idéia de vida após a morte. Ele tenta de todas as formas não se dar por vencido. Não obstante, a natureza implacável não nos deixa formas de fuga do destino.
Somos seres de mente ilimitada e cheios de ânsia pelo eterno. Somos também seres condicionados a um corpo perecível. Por isso, mesmo que queiramos levantar da cama e seguir adiante, "uma fraqueza nos paralisa" e notamos que ainda "não nos trouxeram os chinelos".

Porque são achados grãos de pólen junto aos fósseis de Homens de Neandertal

Na origem do sentimento humano
Quando os homens pegavam seus defuntos
Reunidos em torno todos juntos
Cobriam todo o corpo do decano

Com lágrimas, com flores e um pano
Vivendo o mistério de assuntos
Como a morte, como tudo de rejuntos
Na argamassa do sonho e do insano

A nós que perseguimos o ideal
Por mais que os fantasmas nos assolem
Buscamos sempre mais e mais e mal

A nossa história acaba sem final
Por isso, se encontram grãos de pólen
Perto dos Homens de Neandertal

segunda-feira, outubro 31, 2005

Espreitador

Quero agora um poema
Que espera na janela
Que observa com cautela
Sobrevive no dilema

A poesia pouco lisa
Com somente um olho aberto
Procurando estar certo
Do local onde se pisa

Um poema papagaio
No sentido do cuidado
Do andar bem delicado
Do ator em um ensaio

Um poema que não deita
Que se esconde como a flor
Um poema espreitador
Um poema que espreita...

segunda-feira, outubro 10, 2005

Pactos sem espada

Um humilde agricutor
Indo pra cidade grande
Procurando alguém que mande
Um letrado, um doutor

Foi por todos os lugares
Calejando mais os pés
Foi à feira, aos cabarés
À livraria e a 3 bares

Elevou seu cabedal
Quando um totalitário
Foi chamar de salafrário
Um coitado liberal

Para fazer boas lavras
É com chicote e enxada!
E os pactos sem espada?
Ah! Não passam de palavras...

Será que ela consegue?

Depois de tanto tempo
De pedras e geleiras
No qual de mim saía
Apenas suor, sangue e pus

Depois de tantas guerras
De vitórias e empates
De olhares duros, mortos
De pancadas e rancores

Depois de tantos fatos
Em que tudo é documento
Onde o coração se torna
Mero músculo cardíaco

Depois de tanta vida
Sem flores no jardim
Sem qualquer sentimento
Sem feijõezinhos no algodão

Depois de tanto nada
Dessa ausência de mim mesmo
Dessa falta de carinho
Desse vácuo incontido

Depois de tanto tempo
Sinto que a maldita japonesa
Vai conseguir tirar
Uma lágrima dessas pedras...

segunda-feira, outubro 03, 2005

À Liliane

Eu aqui tomo coragem
Nesse blog tão singelo
De matar o meu anelo
Bem à laia de homenagem

Pense no riso contido
Desse tal poeta frio
Quando leu um elogio
De alguém desconhecido

Só um nome: Liliane
Só um nome e nada mais
Mesmo assim que foi capaz
De fazer que eu me ufane

Me ufano da poesia
Inconstante e diferente
Que fala também de gente
De tristeza e de alegria

De cada poema mudo
Que eu posto nesse blog
Que ora come hotdog
E ora come um X-Tudo

E concluo, bem otário,
Conclamando ao leitor
Que me leu e me gostou
A deixar um comentário

Meia sapatilha e meia meia

É a figura da minha incompetência
O rostinho de menina de mangá
Uma bonequinha japonesa de porcelana e
Os cigarros em seus lábios acesos
Os óculos tão grandes e brilhantes
Os olhos tão miúdos e brilhantes

É a figura da minha incompetência
Por isso marcada em minha memória
É o chiclets velho bem grudado
Não sai, não sei, não quer
E aquela boca doce dizendo não
Sua voz é tudo que eu tenho

A fumaça dos cigarros nos pulmões
Seu rosto como um quadro clássico
Inesquecível, inesperado, inusitado, forte impacto, só
Será que só chamou minha atenção?
É o que espero, digo sinceramente
Pois os meus gostos são estranhos

A história que esqueci de inventar
As verdades que esqueci de dizer
Uma forma diferente de abordar a
Japonesa dos meus sonhos, meus desejos
Tudo isso por causa do momento
Que vivo atualmente de saudade solidão

Eu preciso de uma amiga verdadeira
A caneta velha não me basta
Essas folhas amarelas de árvores papéis
Tudo inútil! Tudo fraco como eu
Eterna ausência de algo que não
Sei o que é de fato

Aquele rostinho de menina de mangá
Aquele aspecto de boneca de porcelana
Aquela boca acesa com cigarros acesos
Aquele não, aquela mentira que esqueci
Aquela verdade que esqueci, a japonesa
É a figura da minha incompetência...

terça-feira, setembro 27, 2005

Throvas a respeytho da negação de Deus em parcerya com Aphonso Robertho sendo as throvas ímpares mynhas y as pares, de meu parceyro

A mesquita tão medonha!
Belo templo de Javé!
O tal Deus é a maconha
Que se fuma com colher

Que se fuma com colher
Que é de prata e de ouro
Roubada de homem, mulher
Tirada de sangue e couro

Tirada de sangue e couro
De toda a alienação
De quem tem medo de agouro
E dos castigos do cão

E dos castigos do cão
Todo mundo tem temor
E foge da danação
Cultuando com fervor

Cultuando com fervor
A enganação celeste
Que considera a dor
Como uma forma de teste

Como uma forma de teste
Perdura a exploração
Que semeia essa peste
Chamada religião

Chamada religião
É o truque de papel
Que transforma a privação
Em caminho para o céu

Em caminho para o céu
Estão milhões de otários
Que esperam rios de mel
E também santos sudários

E também santos sudários
Com a face de Jesus
Que pregando aos operários
Foi pregado numa cruz

Foi pregado numa cruz
Dizem que ressucitou
Acompanhado de luz
Na verdade, putrefou

Na verdade, putrefou
E a bactéria cristã
Diz a lenda, o achou
Mais gostoso que a maçã

Mais gostosa que a maçã
Que Eva deu a Adão
Diz qualquer índio xamã:
"É lenda, enganação"

"É lenda, enganação"
Dizem todos os ateus
Considerando a razão
O maior e melhor deus

O maior e melhor deus
Por muitos considerados
É pelos príncipios meus
Gozado e avacalhado

Gozado e avacalhado
Seja tristeza ou gozo
Pro coitado e pro ladrão
Esse Deus é perigoso

Esse Deus é perigoso
Pega até na traição
Mata o religioso
E cura quem é ladrão

E cura quem é ladrão
E mata os inocentes
Criando um furacão
Traz choro e ranger de dentes

Traz choro e ranger de dentes
Disfarçado de amor
Adentra as nossas mentes
Matando-as sem pudor

Matando-as sem pudor
Enganando o boboca
Que agradece ao Senhor
Por café com tapioca

Por café com tapioca
Até a puta trabalha
Que maneja a piroca
Andando numa navalha

Andando numa navalha
Observando com fé
A montanha que sem falha
Vai até o Maomé

Vai até o Maomé
No trenó do Pai Noel
Ou na arca de Noé
Passeando pelo céu

Passeando pelo céu
Os anjinhos do Senhor
Que entrando no bordel
Depositam seu amor

Depositam seu amor
Na buceta das vadias
Que às custas do Criador
Passam todos os seus dias

Passam todos os seus dias
Ignorando a lei:
Com celestes melodias
É que o pobre vira rei

É que o pobre vira rei
Essa, a maior desculpa
Contudo, perdoarei
Esses pobres não têm culpa

Esses pobres não têm culpa
Pois nem Sherlock suspeita
Que o motivo é que se agrupa
Trilho de bitola estreita

Trilho de bitola estreita
Nem todo vagão suporta
E Deus, que o mundo respeita
Fechada achará a porta

Fechada achará a porta
Do louco divino trem
Que leva à gente morta
As vãs falácias do além

As vãs falácias do além
Só engole quem não presta
Mas de graça como vem
Até injeção na testa

Até injeção na testa
Do Senhor do reino eterno
Que sabendo de uma festa
Se mandou para o inferno

Se mandou para o inferno
Para poder festejar
Trajou-se com fino terno
Com putas pra acompanhar

Com putas pra acompanhar
Mas se esqueceu do chicote
E teve de agüentar
Doze putas no cangote

Doze putas no cangote
Gritaria de lascar
Então Deus bradou seu mote:
"Meu filho vai te guiar"

"Meu filho vai te guiar"
E Jesus obedeceu
Levou-as para o altar
Queixou um pouco e comeu

Queixou um pouco e comeu
Sem anticoncepcional
E a puta que fodeu
Terá um filho infernal

Terá um filho infernal
Ou seja, um trovador
Que como nós faz o mal
Virar remédio e doutor

Virar remédio e doutor
Não exige muito estudo
Basta coragem e amor
Assim como o barbudo

Assim como o barbudo
Derrubou com aviões
O tal Deus que se diz tudo
Derruba com furacões

Derruba com furacões
Derruba com terremotos
Derruba com emoções
Derruba com maremotos

Derruba com maremotos
Pobres surfistas de Cristo
E quem anda sobre motos
Sem carteira e sem visto

Sem carteira e sem visto
Que a Igreja fornece
O coitado é mal visto
E para sempre padece

E para sempre padece
Dentro de um caixão
O destino que merece
Tudo que se diz cristão

Tudo que se diz cristão
Vale nenhuma moeda
Nem sequer um só tostão
Cai junto na mesma queda

Cai junto na mesma queda
Sem caviar ou champagne
O seu cerébro se veda
Que até comer a mãe

Que até comer a mãe
Incesto pecaminoso
Ele diz: "Mamãe, me banhe"
E aproveita saudoso

E aproveita saudoso
A boa graça materna
Ainda anda esperançoso
De obter a vida eterna

De obter a vida eterna
É a vontade do ser
Mas, além da sua perna
Tudo vai apodrecer

Tudo vai apodrecer
Até bucetas, pois, brade:
Tratem logo de comer
No prazo de validade

No prazo de validade
Muitas mentes não estão
Por pura necessidade
Caminham na contra-mão

Caminham na contra-mão
Não querem interno pô-lo
Proíbe a religião
O tal Deus virou consolo

O tal Deus virou consolo
Do mais rico ao primata
Do esperto ao mais tolo
Das moças é serenata

Das moças é serenata
Tão melódica e feliz
Que com celeste cantata
Harmoniza e bem condiz

Harmoniza e bem condiz
Com a mente do otário
De mentira é chafariz
De babacas é aquário

De babacas é aquário
Desses peixes enganados
Em vez de neurônios há bário
São um antro de abestados

São um antro de abestados
Condicionados e cegos
De Deus eles são soldados
Confortando os seus egos

Confortando os seus egos
Nas almofadas de mentira
Temem a cama de pregos
Que é Deus com sua ira

Que é Deus com sua ira
Um grande aproveitador
Diz para o cristão: "se vira
E me dá o seu amor"

sexta-feira, setembro 16, 2005

O sangue que lava a sala

Minha esposa, no chão, nua
Uma lágrima transborda
Amarrada numa corda
E o peito em carne crua

Os meus filhos estuprados
Toda a sala feito pranto
Como fosse um simples canto
De tristeza dos coitados

O braçinho da mais nova
Morto no canto da sala
Que atirarei na vala
Ou enterrarei na cova

Resta da filha do meio
Feridas e mais feridas
Cheiro de inseticidas
Parte apenas de um seio

Do meu filho, o puro falo
Foi repartido em sete
Usando do canivete
E nada mais posso dá-lo

Os meus filhos em pedaços
E eu não posso defendê-los
Vendo o sangue nos cabelos
Que agora não têm laços...

O que sabes de mim?

Sabes, senhora, que tenho eu passado?
Sabes acaso qual dor me apavora?
Qual é o ombro em que a alma chora?
Quais são as lágrimas que tem chorado?

Sabes, senhora, o que é não ser amado
Na hora do choro, no choro da hora
Ver a amada de pé indo embora
Quando você chora ajoelhado?

E chorando gelo no frio do inverno
Veja minha vida é puro penar
Triste minha alma passeia no inferno

Por um alguém que eu não posso amar
Choro, mas choro um choro eterno
E tu me pedes para não chorar...

quarta-feira, setembro 07, 2005

A súplica ao avião

Avião, eu tenho um tio
Que em defesa do Brasil
Foi embora pra Campinas
E agora, avião
Meu pequeno coração
Se aperta em dores finas

São as dores da saudade
Que apesar da minha idade
Sinto que em mim existe
Você voa pelo céu
Ele cumpre seu papel
E eu fico longe e triste

Avião, o que eu faço
Para ter aquele abraço
Que me aperta e não solta?
Avião, faz um favor
Te dou todo meu amor
Mas traz o meu tio de volta...

terça-feira, agosto 30, 2005

Pago o que devo

Na lanchonete que há ali na esquina
Os bons ateus se unem na patota
Cada um deles bebe sua cota
Cada um deles conta sua sina

A Bíblia Sacra é bastante fina
Na discurssão que a mocidade adota
A caçoada nunca se esgota
A gargalhada logo desatina

Realidade! É o que eu tenho visto
Na lanchonete que a rua conduz
Como eu não bebo, eu só peço um misto

Queijo, presunto e o velho "orange juice"
Esse é meu modo de pagar a Cristo
Tudo que Judas deve a Deus Jesus

O que houve?

Certo que foi a ida ao cemitério
Foi a morte imersa nesse frio
Minha alma imersa no sombrio
Minha mente imersa no mistério

Foi uma face de um esqueleto sério
Um cérebro jogado no vazio
Os ossinhos de cadela no cio
Foi uma foice que lhe atinge e fere-o

As pegadas de porcos pelo chão
O fartum. O odor de sangue e pus
Plainava sobre a vela do caixão

Foi isso que tirou do sol a luz
Foi isso que empregou a negridão
Medo que rasga nossos céus azuis...

Drogadição

O sono do narcótico, o prazer
Fumaça da pedra de crack acesa
Carreira de pó branco sobre a mesa
Muito whisky com gelo pra beber

Maconha na cartilha do ABC
Um chá de cogumelos na certeza
De não mais encontrar a velha obesa
Da qual comprou seu LSD

A noite que disfarça seu estado
Vagas percorrem seus olhos vermelhos
Os olhos do mais obediente gado

A mãe não tem palavras nem joelhos
E o valor da vida pro drogado
Não passa de vidraças e espelhos

quarta-feira, agosto 03, 2005

Uma cena

Vomitou seguidamente na telha
A chuva lhe caía na corcunda
E caminhava pela água imunda
Que lhe molhava a boca e a guedelha

Desesperado - à guisa de fedelha
Eis que se viu a escorrer da bunda
O pedaço de fezes que afunda
E que apaga a última centelha

E vendo um rato a lhe roer o saco
Como humano que do lixo almoça
E da muxiba, só degluti um naco

Cambaleando, ele cai na fossa
Em seus ouvidos só se escuta: "Fraco!"
E são ols ratos que lhe fazem troça

domingo, junho 19, 2005

Elegia a uma aberração

Eis que se viu na infeliz placenta
Um feto, um pedaço de gengibre
Cujo crânio superava o calibre
Da fenda vaginal da macilenta

Talvez no choque do osso com o osso
Voltasse para dentro da mãe tísica
E até zombando das tais leis da Física
Fosse expulso no intestino grosso

Mas como todo pobre metediço
Não deu ouvido a qualquer queixume
E reduzindo seu cruel volume
Passou estreito e se tornou maciço

Num forte espasmo, eis que entrou no mundo
Aquele platelminto meio humano
Que enxugado num humilde pano
Foi decretado como moribundo

Era o resumo do feio e do horrendo
E besutando na escória cálida
Louco soltou-se do umbigo da esquáilida
Contra o destino, foi sobrevivendo

Destarte, começa o destampatório
E se indaga se a aberração
Merece ter direito a vida ou não...
E o que é da mãe no pós-operatório?

Então, dá-se início ao escrutínio
O cume e a glória da democracia
Todos os votos contra a covardia
Exceto um, a favor do assassínio

A criatura cresce, entra na infância
Naturalmente lhe nasceu um buço
Que lhe tornou até mais inconcusso
Na senda da feiúra e da ganância

A criançada toda o insulta
Entre troças, moteos, caçoadas
Chacotas, desfrutes e surriadas
Chega o monstrinho à idade adulta

Coitado afunda-se nas estultícias
Natuais, mas no caso excessiva
Como houvesse algum demo que motiva
A busca libertina por patrícias

No entanto, nenhuma das desejadas
Mostrava-lhe um pouco de luxúria
Até que ele confessou com fúria:
"Eu não sei cortejar nas patuscadas!"

O modo que achou em sua gaveta
Empós a tão plangente confissão:
Procurar na patota um bom ladrão
Pra servir de amigo e proxeneta

As moçoilas não se submetiam
À libido insaciável do ser
Que só tinha na mente o prazer
E nada mais os neurônios viam...

Não se abateu ante ao insucesso
Decidiu visitar um alcoice
Envergonhado, o diferente foi-se
Com seus passinhos de um réu confesso

Não esperava que em seu porvir
Quando ele chamou uma rameira
Pra trabalhar com sua parceira
Sexual, tivesse de ouvir:

"Não pecúnia no mundo que pague
Esse nojo de dividir a cama
Como esse infeliz que a mim me chama...
Antes prefiro a morte e o azorrague!"

E fez convicto a derradeira escolha
Tomando em suas mãos o escalpelo
Rompeu a artéria com tamanho zelo
Que feneceu suave com a folha...

Houlenn ola

Ontem o padre foi a minha escola
Linda estava a tua estola
A todos nós, ele nos deu esmola

O Zezinho pôs tudo na sacola
Luizinho me pegou pela gola
Aí me roubou e quase me esfola

Olha o José ali jogando bola
Lá o Luís está cheirando cola
Aqui estou eu preso na gaiola

Onde eu sou o covarde sem mola
Lugar onde a angústia sempre me assola
Assim como um náufrago na marola

terça-feira, junho 07, 2005

O que farias, moça?

Tu estavas tão louçã
Que eu não achei por mal
Aumentar teu cabedal
Com uma libra de avelã

Não imaginei que ias
Se portar de tal maneira
Que plantasses bananeira
E pulasses de alegrias

Quando forte me beijaste
Minha boca estremeceu
E senti no beijo teu
O crescer de minha haste

Então pensei: sou um vate
E o que tu, moça, farias
Se te doasse poesias
E caixas de chocolate?

Desculpas pela autoria de poema

Certo dia falei da emoção
Desculpe o poeta emocionado
Se algo modifica seu estado
Não se utiliza da sua razão

Mas hoje, com minha tão sóbria mente
Penitencio a mim mesmo por
Ter proferido com tamanho ardor
Afirmações de forma veemente

Eis que resolvo permutar então
O meu excesso pela inteligência
E o que disse com a veemência
Por uma sóbria interrogação

O que é melhor levar para o banheiro:
Um fuzil automático e leve,
A consciência de que nada deve
Ou a guitarra do Kiko Loureiro?

Erros aceitos

Tenho errado muito ultimamente
Também queria só voltar atrás
Pra corrigir todos os erros tais...
Não é possível isso atualmente

Então, contento-me em haver errado
E me arrependo do que eu hei feito
E bem sabendo que não sou perfeito
Eu lanço os erros todos pro passado

Faço a limpeza da minha consciência
Já que não há mais pra fazer
Mesmo se eu não cumpro meu dever
Errar faz parte da nossa vivência

Anelo paterno

A vida miserável de rotina
Que o bom Deus do céu me concedeu
Tornou-me racional e quase ateu
Digo quase por causa da menina

Que gerei e hoje tão pequenina
Há de ter o sonho de ir pro céu
De ter seu príncipe no himeneu
E habitarem juntos a colina

Como pai, eu só tenho um escopo
Na praia, tomando água de côco
Contar algumas fábulas de Esopo

E se ela achar que ainda eh pouco
Lhe levar a colina, até o topo
Matar dragões, príncipes e ser louco!

As loucas do Milênio

Eu tenho várias cunhadas
Que contam suas lorotas
Que andam sempre janotas
Esbeltas e perfumadas

Moças até engraçadas
São motivos de anedotas
De jocosos e de frotas
São donzelas bem amadas!

Todas elas têm um gênio
Tão forte e enigmático
São as loucas do milênio!

Eis um fato problemático:
Elas são um nitrogênio
No meu anel aromático

Matricida cibernética

Desempoando o protocolo crasso
Qie encrimina um certo matricida
Um criançola que em minha vida
Foi a figura do mostro e do lasso

Em outro alguém eu nunca vi um traço
Daquela criatura horrenda e ungida
Por óleos bem modernos na partida
Exercitando só o dedo e o braço

Rompendo com o que se chama ética
Buscando a todo custo me vencer
Entrou em minha sala quase hermética

Entrou por fios, entrou sem eu o ver
Tornou-se matricida cibernética
Matou a placa-mãe do meu PC

sábado, maio 21, 2005

Sentimentos verdadeiros

Na memória, eu tenho seu rostinho
Seus dentes, seus cabelos cacheados
Lembrando dos abraços apertados
Das suas mãos pequenas, seu carinho...

Minha família toda num só ninho
Que era aquela cama pra casados
E nos fins-de-semana e feriados
Ela era a alegria do cantinho

Eu morro de saudades da sobrinha
Que vinha me acordar de manhã cedo
Com um jeito que apenas ela tinha

E quando segurava no meu dedo
Virava a princesa e a rainha
E eu virava apenas o Tio Pêdo

Palavras de um medroso

Boa noite, dona Lica
Como vai a sua graça?
Decerto a vida passa
E mais bela você fica

Lembra de um fidalgote
Que a ti te cortejava?
Foi ali te vendo brava
E usando do chicote

Que fiquei enamorado
Por você, minha donzela
E no altar da capela
Eu só subo ao teu lado

Você é a moça forte
Uma fruta, um legume
Toda força se resume
Na grandeza do teu porte

Não mantenho em segredo
O amor que te dedico
Quero bicar o teu bico
Mas confesso: tenho medo

A tua rusticidade
E minha caquexia
Não me dão a garantia
De manter a integridade

Os casais atualmente
Chegam a vias de fato
E pancadas não são trato
Que meu corpo agüente

Não caio no teu abismo
Posso até ser um inepto
Mas não sou nenhum adepto
Do tal sadomasoquismo

O aniversário de Pedrinho

Pedrinho estava completando cinco anos de alegra e inocente existência. A família reunida na mesa para o desjejum recordava os momentos de intensa emoção vividos desde a vinda do tão esperado menino. De fato, o casal Paula e Roberto tinham gerado anteriormente duas meninas que naquela data eram já moças bonitas e simpáticas. Depois de pão, leite, café, geleia e frutas; os cinco iniciaram a viagem, Seu Roberto no volante, rumo ao interior do estado, rumo à casa da Vovó Augusta.
Na chegada, abraços, arroz e capote. Dona Paula tomou do aniversariante, deitou com ele na rede e ali dormiu tranqüila. As moças conversavam. Aqui o céu é mais azul, olha o bezerro mamando, olha a galinha, que galinha esperta... Falavam de Frederica, a galinha de bigodes. O negro que lhe coloria a região acima do bico renderam-lhe a fama e o pseudônimo. E a tarde passou como o vento do sertão.
Quando o preto dos bigodes de Frederica dominou o céu sendo pingados aqui e ali por estrelinhas, a comemoração da data natalícia de Pedrinho teve início. O menino pegou um pouco de pipocas e desatou a pular, comer e brincar pelo sítio. De repente, deu de cara com a galinha famaz.
Ela, diferentemente das demais, mostrando-se sem temor, interagiu com a diversão do pequeno e ganhou-lhe a amizade. Usando de sua sensibilidade infantil, Pedrinho pegou todo o milho e começou a jogá-lo para o alto e a dá-lo no bico de Frederica que os comia sem receios. Outros galináceos se ajuntaram e participaram da divisão do milho.
Depois de muita estripulia, Pedrinho se viu cansado e voltou para junto da mesa onde estavam seus familiares.
- Mãe, eu quero pipoca.
- Meu filho, a pipoca já acabou...
- Mas, mãe, eu quero! eu quero...
- Não há mais.
E o barulho daquele choro ecoou por todo espaço celeste sertanejo. Eu quero, eu quero, eu quero. Dona Augusta, em sua sabedoria de avó, colocou o menino no seu carinho:
- Vem cá pro colinho da vovó...
E com aqueles afagos e carícias, o volume do choro foi diminuindo até ruídos quase inaudíveis. Então, a sábia falou:
- Meu neto, meu tão pequeno neto, aprenda desde já uma coisa pra tua vida: quando acaba o milho, acaba também a pipoca...

Conquista pré-modernista

Tomei nas mãos a linha e a agulha
Transparecendo minha erudição
Tomei o bonded ao café do Cão
E degluti o preto com Carminha

Moçoila mui esbelta e prendada
Que tem por vício o pegar em cabos
Por isso não lhe mando aos diabos
Buscando aproveitar-me da coitada

Mostrando o meu lado animalesco
Tentei tirá-la do grupo das laicas
Nas posições de coito mais prosaicas
Agi num movimento pitoresco

Sugou-me tudo como as esponjas
Num devaneio, quase me exaspero
Demonstrações de seu prazer sincero
Fez tudo que pedi e sem lisonjas

Meu desempenho quase a arrasa
Alegre, mas com um pouco de febre
Sem permutar o bom gato por lebre
Às quatro e quinze, eu bati em casa

Minha nobre decisão

Olha aquela bucetinha
Tão gordinha e bem raspada
E a dona ainda tinha
A bundinha delicada

Sua pele cor de jambo
Como dizem as cantatas
Eu queria ser seu Rambo
Mas ela não tinha matas

Ela era bem macia
Sua carne ainda insossa
Facilmente eu concluia:
Ela ainda era moça

Os seios pequeninos
Nunca foram apertados
Atiçavam os meninos
E velhinhos aloprados

Quando inteiramento nua
Veio a mim me procurar
Relaxei, olhei pra lua
E tentei me segurar

Sua cara de carente
Excitou o meu bichinho
Consegui usar a mente
E falei-lhe com carinho:

- Minha filhinha querida
Não posso te penetrar
Pois a tua perseguida
Não agüenta a minha pá

Eu tenho uma proposta
E espero que aceite...
Não vire pra mim de costa!
Vou apenas te dar leite...

domingo, maio 15, 2005

Hipocrisia

Alguns me consideram um beato
Por causa dessas marcas nos joelhos
Alguns até escutam meus conselhos
Devido a minha calma e meu recato

Eu vou dizer-lhe o que sou de fato
E assim me vejo ao olhar espelhos
Sou mais promíscuo do que os coelhos
E o erotismo já me é inato

A minha alma é uma carniça
Na qual impera o sangue e o pus
Todas as vezes que vou ouvir missa

Eu nunca fico contemplando a cruz
Só admiro os seios da noviça
E neles vejo meu Senhor Jesus!

Não comam peixes

De longe avisto dentro de uma chata
A minha doce e linda maruja
Pele mais negra, a roupa toda suja
Assobiando a nossa cantata

Eu não esqueço nunca essa data
Mas eu desejo que ela logo fuja
Alguém me disse como uma coruja
Que estava com o Mal de Minamata

Então, eu fui matar na piracema
Os que mataram o meu coração
Em suas águas cheias de sal-gema

Ainda escuto hoje a canção
Desse seus lábios como num poema
E só maldigo os peixes do Japão!

sábado, abril 30, 2005

Tendências suicidas

O que sente o suicida ao olhar a morte,
Destino inevitável do seu ser?
Pensa que tudo se resume no saber
A hora certa de romper a veia forte

E partindo, uns pro sul, outros pro norte
Pensariam o que vale o viver
Esse ciclo eterno, plantar, colher
Onde uns morrem e outros tem sorte

Saltemos fora da ponte da vida
Olhando pro nosso destino certo
Com a oculta alegria da partida

Sintamos o calor do peito aberto
Adiantemos o final dessa corrida
Pra quê rodar se nosso fim está tão perto?

Nietzche

A alemãzinha dançando tão meiga
Externamente um anjo tão puro
Por dentro é um abismo escuro
Sem ar, sem água, sem pão, sem manteiga

Só com desejos sensuais e eróticos
Transvaloriza todos os meus valores
Me aguça o olfato com seus odores
Ativa sonhos com seus olhos góticos

Quero comê-la como um animal
Com vontade de potência e pá
Quero após isso tudo retornar
Eternamento ao ato sexual

Quero algo como o sexo dos cães
Contra lei, regra, ordem e nazismo
Daremos cabo do cristianismo
E a culpa será dos alemães!

Segue teus instintos

Morde o seios da mãe, puta valente
Engole o leite podre que alimenta
Martiriza diabos na água benta
Que escorre da genitália quente

O sulco vaginal amargo e ácido
Lavando os dedos do seu pé amigo
Enfia com carinho no umbigo
O seu pênis tão pequenino e flácido

Acomoda sobre o corpo vadio
Sua pele tão pura e sua alma
Relaxa e entrega-se com calma
À essa terra de pecados mil

Na tenra idade fora molestada
Pelo pai, homem duro e turrão
E escolheu a prostituição
Como ofício e função forçada

Criança, faça o que vier na mente
Toca as carnes macias desse peito
A auréola rosadinha, com jeito,
Abri sua boca e enfia o dente!

A potência das frases

Frio. Os mamilos das meninas estavam duros como as pedras que encontrei pelo caminho. Os sacos escrotais dos meninos se recolhiam como um gatinho inofensivo diante do mais feroz predador. E eu, com as mãos nas axilas, batia meus dentes amarelos esperando a noite, velha companheira, preta e triste, para terminar mais um expediente de mesa, papel e escritório.
Era dia da morte de São João Batista, aquele que não é "um caniço agitado pelo vento". Não penso num caniço. Não penso nunca nisso. Apesar dos milagres que presencio diariamente, sou ateu. Ateu daqueles de rezar terços ao tinhoso, de retirar restos de fezes com páginas da Bíblia.
Naquele dia, eu vi uma menina cantando sozinha pela calçada da Rua Alfredo Rodrigues. "Foi por medo de avião que eu segurei pela primeira vez lá lá lá lá...". Aquele ursinho branco, barato e ridículo em seus braços e aquelas marcas de alegria e chocolate nos seus lábios finos me inquietaram. Menina maluca; eu, hein? E ela cantava mais alto. Fiquei cada vez mais angustiado, interno, comprimido, fazendo pequenas bolinhas com meus sentimentos, como fossem papel. Corri e a cada passo um emoção ia se abrindo qual uma boca no bocejo e, ao encontrar-me face a face com a desgraçada, gritei:
- Foda-se, guria... ok? Você é uma putinha, uma vadiazinha....
Ela saiu chorando com suas pernas rápidas. Eu ri e, fumando um cigarro, percebi que não gosto muito de pessoas felizes.

Campeonato de xadrez

Aquele ia ser um dia feliz. A garotada empolgada com o grande torneio de xadrez que ia acontecer. Isso mesmo, senhores, um empolgante torneio daquele joguinho de 64 casas, 32 peças, valores diversos, mentes diversas - inútil.
- Inútil? Quem sabe? Mas é divertido pra caralho!
Gritos. Gritos paradoxais para aquela brincadeirinha chata. No entanto, aquele dia não era um qualquer. Já estava tudo combinado: o Nerd ia trazer a aguardente; o CDF ia trazer a carne; e o Preto ia ser, digo, ia trazer o carvão.
- Vamos pra saca! Vamos pra farra!
O garoto dos óculos redondos ia trazer a esperada puta. Claro, o torneio tinha de ter um prêmio.
- Ô bitolado, quem vai comer essa puta?
- zzz...
Dormiu. Na vontade grande da vitória, estudou uma meia dúzia de estratégias durante a madrugada inteira. No mais, animação. Aquele ia ser um dia feliz. Chegaram todos. Cachaça? Presente! Churrasco? Aqui! Puta? Cheguei! Ruy Lopez? zzz... Ruy Lopez? zzz.... Ruy Lopez?!?! Opa! Estudada!
- Vamos dar início a mais um torneio de... torneio de.... de....
- Xadrez!
- Xadrez... Xadrez? X-A-D-R-E-Z?!?!
- Quem trouxe xadrez?
- Puta que pariu! Será que ninguém trouxe xadrez?
- Eu trouxe damas...
- Damas? Cala a boca, sua puta!
- Dedada na puta! Chute na puta!
- Nããããão.... Vamos comer a puta!
- Todos juntos?
- Impossível... impossível...
- Que porra é essa? Eu quero é Xadrez!
Silêncio. Respeito ao nome santo. Todos baixam a cabeça e se arrependem sinceramente de terem esquecido de trazer um necessário e adorado xadrez. Choro calado. Lágrimas solitárias.
- Ah! Vocês são um bando de criancinhas choronas.
Vidro. Cabeça. Aguardente com sangue. Óbito.
- Ela morreu...
- Necrofiliaaaaaaa!
- Que é isso? Seu taradão!
- Que é isso? Que é isso o quê? Necrofilia!
- Necrofilia! Necrofilia!
- Ne-cro-fi-lia! Ne-cro-fi-lia!
Festival de pênis encima da moça mora. Boca, buceta, cu, ouvido, nariz, umbigo, entre os dedos dos pés... Tocaram o foda-se! É, senhores, nem sempre a juventude mantem suas emoções intactas diante da morte.

Solução intelectual

A felicidade pegou de Marcolino e levou-o aos festejos no vale das Augustas. Danças, parati e putaria. Que mais queria a juventude naquela noie para cachorros e lobos? Afetavam suas sobriedades com o álcool, amavam-se a luz do luar e bailavam enquanto as colcheias e semicolcheias saltavam do saxofone de
seu Chico Mota.
Marcolino até ali havia sido um pobre-diabo cincunspeto e apático. Nada de alegrias, isso é propriedade exclusiva de malandros e basbaques. E assim continuaria a ser e pensar, não fosse a interferência maligno-bendita de Sabastiana. Essa rapariga não tinha palminha de rosto, mas para aquele nádegas-flácidas (se me permitem a expressão) era como um bom naco de picanha bem passada.
Ali estavam ambos: ela movimentando seu corpo pecaminoso em gestos com motivos sexuais e ele balançando suas camadas adiposas de um lado a outro. Nunca se havia imaginado capaz de executar tamanho despautério, no entanto, após alguns goles da boa e velha aguardente cearense até o bom moço se reveste da máscara do ridículo. Foi piorando paulatinamente. Tombou gordamente no solo imundo, defecou nas calças as quais não honrou e vomitou tal qual um bezerro preto e magro a excretar os próprios órgãos pela cavidade bucal.
A rapariga que lhe fazia o cortejo de acompanhante, vendo o coitado naquela situação suína, reclamou o auxílio de terceiros. O mais sábio e mais audaz presente no recinto forneceu a solução intectual para o caso:
- Encaixe o nariz desse egoísta em seu umbigo, que mais parece um povo profundo. Cole as extremidades dos membros inferiores na região posterior do crânio. Coloque tudo dentro de um saco d elixo e lançe essa imundície esférica para uns quatro quintos dos infernos, que é o espaço aproximado que ocupará.

Conclusão que eu cheguei

Meu cinto, meu sapato, minha platina
Minha barba, meu rosto, meu corpo todo
Isso tudo que tenho é puro lodo
Onde se cospe, mija, caga e pina

Tudo é errado, todos julgam mau
Meu passo, minha forma de marchar
Meus comandos, meu viver, meu andar
E meu modo de segurar o FAL

Quando fecho meu coração aberto
Também racionalizo meu estado
Noto que todo mundo está errado
E eu, logo eu, sou o único certo!

Alucinações patológicas

Criatura infeliz e raquítica
Agora quero vê-la entrar em coma
Com socos deixarei um ematoma
Com chutes levarei à fase crítica

Odeio sua consciência mítica
E esses remédios que ela sempre toma
Transformarei seu protossifiloma
Em doída roséola sifilítica

É raiva, ódio, violências sérias
Rancor, vingança, sofrimento e ira
Vontade intensa de ficar de férias

A existência da infeliz vira
Será roubada pelas bactérias
Se é que um dia ela existira...

Cães inoportunos

As náuseas caninas do meu amigo
Que eu escutava quando dormia
Queimavam-me o cérebro qual asia
E eu me agitava dentro do abrigo

Não conhecia o grande perigo
De em um quartel de Infantaria
Juntar outros cães em sua agonia
Romper amizades: eu sempre consigo

Com meu sangue frio e olhar implacável
Peguei a arma, fiz cara de mau
Naquele pescoço de ser amável

Com baioneta, fiz corte letal
Antecipei o destino imutável
Matei cachorros com tiros de FAL!

Ódios e adorações

Eu odeio microfone
Eu odeio as pessoas
Eu odeio coisas boas
'cause I live alone

Eu odeio ver piroca
Não sou chato, burro e besta
Não vou pra casa na sexta
'cause I'm not carioca

Eu adoro meu fuzil
Gosto de cortar cabeça
De quem me desobeça
'cause I born to kill

Vivo a vida castrense
Eu adoro rapadura
Mantenho minha postura
'cause I am cearense

Uma grande descoberta

Descobri do que não gosto
Não são livros nem leituras
Nem desenhos nem figuras
Nem poltrona onde me acosto

Não é música baiana
Muito menos rock inglês
Nem preguiça de burguês
Nem escravo a beber cana

Não é casa, apartamento
Nem mansão ou algum carro
Tampouco mulher de barro
Ou mulheres do momento

Nem morango ou chocolate
Nem cebola ou agrião
Nem é bife, arroz, feijão
Macarrão, alface e mate

Nem xadrez, nem matemática
Nem boate ou malandragem...
Eu não gosto é da linguagem
Utilizada em função fática!

Sertaneja do Planeta

Com seu hímen bem intacto
Imaculada buceta
Penetrada no impacto
De um dedo e uma caneta
Nascida dentro de um cacto
Sertaneja do Planeta

Está sempre bem trajada
Chapéu de couro e gibão
Protegida e guardada
Sempre ao lado do irmão
Começa a ser desejada
Por machos da região

Menina pouco vivida
Os seus seios imaturos
E já foi acometida
Por alguns oxiúros
A catapora perdida
Lhe deixou milhões de furos

Ela é feia, burra, chata
Mas há algo especial
(apaixona mais que as gatas
modelos da capital)
Por dentro de suas matas
O caminho vaginal

A muitos cabras bem machos
O desejo tem vencido
Sejam altos, sejam baixos
O bichinho é crescido
É como uvas nos cachos
Com um chessburguer metido

Tudo tem sua hora

Atravessou correndo uma rua
Movimentada da cidade de Campinas
Subiu sem cordas ao alto das colinas
Mesmo sabendo que o homem não flutua

Engoliu dois ratos e uma mosca
Defecou tudo isso pelo cu
E sem saber nada de Kung Fu
Desafiou o famaz Mestre Rosca

Fez tudo que se chama estripulia
E se safou sem nenhum ferimento...
Infelizmente, chegou o momento:
Jogou bola e foi pra enfermaria!

A Palavra é...

A palavra é
acima de dicionários, de gramáticas, de professores
acima de sonhos, de desejos, de futuros
acima de faca, de bala, de lâmina
A palavra é
acima de xingamentos, de provocações, de escárnios
acima de tenentes, de ignorância, de rispidez
acima de sons, de gemidos, de ondas
A palavra é
acima de receitas, de cozinheiros, de médicos
acima de japoneses, de árabes, de alemães
acima de diferenças, de semelhanças, de preconceitos
A palavra é
acima de terras, de mares, de céus
acima de ordens, de leis, de estatutos
acima de mim, de ti e de todos
A palavra é
acima de tudo
poesia

sexta-feira, março 25, 2005

Homenagem a Afonso Roberto

Um héroi da sintaxe e da palavra
Ser real feito mito legendário
Tendo às mãos sua terra - dicionário -
Ele a capina, planta, colhe e lavra

Poeta que merece um altar
Pois zombando de santas divindades
Cantando as nossas realidades
É o Deus da poesia popular

É vulto nobre da literatura
E admira a mulher bonita
Além de habilidade na escrita
Tem elegância até na leitura

0h! Boa-nova para o povo ateu:
Alegrai-vos! Mantei o olhar altivo
Pois esse homem permanece vivo...
Alegrai-vos, Afonso não morreu!

quinta-feira, fevereiro 03, 2005

Supérfulos

Aristides entrou em casa, olhou o jardim e gritou desesperado:
- Que fizeram com minha planta?
Aquela era a única espécie da região. Ela a comprara em uma viagem à Capital há três anos. O vegetal adaptou-se ao clima semi-árido sem reclamações. Olhando a planta, via-se que o atentado não era de cunho pessoal: roubara-se apenas os galhos.
Aristides morava apenas com sua avó paterna. Cega e coxa, já não tinha possibilidades de fazer outra coisa senão escutar no rádio músicas que lhe lembravam a primeira eucaristia. O velho terço de madeira fora perdido e sua vista ineficiente tornou as chances de encontro diminutas. Não havia dúvidas: a velha nada tinha haver com o furto.
Cabe ressaltar que os ganhos com a venda de folhas haviam dado ao infeliz grandes artifícios de proteção. Ao mínimo toque nos muros da residência, eram ativados dispositivos geradores de dor, sangue, morte e ranger de dentes. Se por acaso algum paranormal conseguisse chegar ao topo da parede sem tocá-la, a cerca elétrica o pararia. Até mesmo se conseguisse ultrapassar o obstáculo em um só pulo, os raios infra-vermelhos ligados do telhado ao muro ordenariam a cinqüenta fuzis o estralhaçamento total do indivíduo, controlado de modo que nenhuma gotícula de sangue toque a planta sagrada.
Inaudito furto. Aristides mesmo se utilizando do monopólio nunca esqueceu-se das leis de oferta e procura. Tinha a inútil preocupação de não colocar muitas folhas no mercado temendo a baixa dos preços, mesmo sendo ele o seu único impositor.
Resolveu-se então subornar alguns cientistas para realizarem exames de impressão digital no vegetal ilegal e em toda a população local. Encontrou-se então na pracinha um maconheirozinho qualquer, personagem muito comum no logradouro após a viagem de volta de Aristides, e definiu-se pois nele o audacioso autor do crime.
Diante de tal façanha, receiando que a polícia estadual descobrisse seu modo de subsistêncua, o "agricultor" limitou-se a perguntar como ele conseguira realizar o ato famaz.
- Entrei na casa normalmente e peguei o que precisava.
Dessa forma foi que Aristides notou que na sua casa não havia porta.

Moral: "Tem gente que se preocupa com os galhos, pois não sabe que é no tronco que está o coringa do baralho" (Raul Seixas)

O tamanduá e o bezerro, fábula infantil

Encarceraldo era um bezerrinho maroto. Não obstante isso, todo domingo ia à lagoa Igrejiaçu para beber água e assistir à missa do Peixe-espadre, o sacerdote da fazenda. Ele, o bezerro, se orgulhava de morar naquele recanto onde podia pastar o dia inteiro sem incômodos; visto que o dono da fazenda, bicho-homem, sempre estava disposto a protegê-lo com sua espingarda de cano duplo.
Todo dia, um certo tamanduá que tinha por nome Parcimonioso passava ao redor da fazenda e escutava os orgulhos os quais Encarceraldo forcejava por trazer a insulto.
- Nada melhor que minha fazenda. Tenho proteção, água, carinho. Isso é um sonho. É muito diferente dessa vida selvagem de um comedor de formigas...
Parciomonioso, Niozinho para os mais chegados, não saiu de sua sobriedade e permanecia em silêncio diante dos regozijos do bezerro. Ele era um sábio, creio. Só não usava óculos porque formiga faz bem pra vista.
Certa época, porém, uma intensa seca sobreveio à região. Em dois tempos, a lagoa secou; em quatro tempos, o Peixe-espadre morreu; e, em oito tempos, o bicho-homem foi embora para a cidade grande. Sozinho, sem água e comida, Encarceraldo falecia em frente ao tão achincoalhado Niozinho. Então, o tamanduá entrou na fazenda e jogou aquela carcaça fora. De agora em diante, a fazenda tinha outro dono.
Parcimonioso dormia no aconchego da fazenda e de manhã ia atrás de comer formigas - por que não? - algumas fêmeas de sua espécie, coisa que o solitário Encarceraldo nunca soube o que é.

Moral 1: A verdadeira liberdade não é está dentro ou fora da fazenda, mas é entrar e sair a hora que bem entender.

Moral 2: Quem não tem fêmea se contenta com água e capim.

Cotidiano africano

O quadro branco em minha mente solitária
Lembra-me fatos que o sangue não lavou
E na janela, a guarra revolucionária
Faz um poema com verdade e rancor

Melancolia em meus óculos escuros
A minha alma afogada e amarela
Não detecta quem são os homens puros
E lambe os ossos existentes na tijela

Um leopardo fugindo do seu destino
Cruza a ponte que conduz à salvação
E lá de cima desce a águia e um menino
Com asas fortes construídas com latão

O tempo é curto, o peito é firme, a veia é frágil
Rompe-se! Explode a existência pelo ar
A força ativa junto a espada ágil
É a gravidade desse sistema solar

Das Reich des Teufels

Texto de autoria minha em parceria com Afonso Roberto

Das Blut sprieβt auf dem Garten von Gott
Es verkündet die Macht vom Tod
Und der Teufel gegebener Hände mit dem Stern
Kupiet weintrauben und er beginnt zu feiern
Macht die Lampen aus und zerstört die Uhr
Reiβt die neve Hose und wieder macht die Frisur
Sein Mut ist warmer als Kaffe
Lacht noch und schreit für all seine Idee
,,Ich bin der König, du weiβt das, Mann
Ich bin das Gesetz, nur ich befehle, nur ich kann!"
Und werfen in unseren Augen die Wirklichkeit
Wir besteigen die Berge von der Krankheit
Ich will Schach spielen und nicht bitten
Ich will alles vergessen und nichts bieten
Die küche von Hölle ist ein Schiff
Sie kocht Wurst und schreibt eine Brief
Adressierte zu den bewuβten Männern, das werden sterben
Noch Pferde noch Hakenkreuze bewahren ihre Leben

sábado, janeiro 29, 2005

Velho agricultor anarquista

Texto de minha autoria quando mais moço sob o pseudônimo Roberto Cabral
[ p.roney.vila.bol.com.br ]

1.

Sou um velho agricultor
Colho fome e desgraças
E também escrevo versos
Em minhas poucas horas vagas
Versos pobres sem lirismo
Sou do povo estigmata
Povo cheio de abandono
De miséria e de nada

Os meus filhos são doentes
Bem mais vermes do que filhos
Corpo inteiro pesa menos
Que o grande intestino
Os espinhos que eles comem
Deixam-lhes bem mais famintos
As desgraças desta vida
Eles cultivam comigo

Também tenho filhas putas
Frutos podres de mim mesmo
Todas têm uma etiqueta
Indicando os seus preços
Elas moram na cidade
E me tratam com desprezo
Acham que a própria vida
Vale menos que dinheiro

As palhas onde habitamos
São feitas de esqueletos
Cimentadas com miséria
Fortalecida com tempo
Na cozinha só existe
Os espinhos que comemos
E que sempre são salgados
Pelos choros de lamento

Minha vida é privação
Do que é próprio da vida
Isso faz da própria morte
Mais irmã e mais amiga
Eu tomo por meu destino
Morrer um pouco por dia
Pois minha vida é muito fraca
Desnutrida e franzina

2.

Sou um velho agricultor
Minha terra é muito magra
Se plantando nada dá
Só doenças e mais nada
Nós colhemos bactérias
A colheita não tem data
E até antes do plantio
A colheita já se acaba

A chuva que vem do céu
No céu mesmo evapora
Não existe nada verde
É marrom a nossa roça
Nosso mundo é franciscano
É marrom também a horta
Nessa vida de pobreza
Escavamos nossa cova

Não tenho nada de carne
Nem ao mesmo no meu corpo
Esta vida me deixou
Menos homem e mais osso
E até o meu esqueleto
Tornou-se frágil e oco
A magreza se espalhou
E infectou o corpo todo

Sou um pobre aprisionado
Lutando contra o destino
De tirar meu alimento
Deste solo sempre extinto
Mas minhas idéias voam
Mais longe que imagino
Rompem todas as barreiras
E superam interditos

Eu não sou nenhum romântico
Sei que não existe jeito
Nosso mundo é egoísta
Todos querem o governo
As pessoas andam tristes
E trabalham sem sossego
Todos acham que o prazer
Vale menos que dinheiro

[...]

Para ver o final, http://p.roney.vila.bol.com.br/rcvaa.htm ...

Psicopata incompreendido

Texto de minha autoria quando mais moço sob o pseudônimo Roberto Freire Jr.
[ p.roney.vila.bol.com.br ]

Um psicopata lembrou algo

Ele lembrou que a vida pode ter
Cento e vinte anos e nove meses
Mas também pode acabar antes
Que o abrigo da vida se forme

Ele lembrou que quem mata é assassino
Que todos, mesmo sem terem direito
a pão, saúde, educação e um coração vermelho
Deve ter uma chance de arranjar um jeito de sobreviver

Ele lembrou que ninguém é o dono da vida
Nem sua, nem dos filhos, nem de ninguém
E que tirá-la é roubo, furto, crime
Em qualquer circunstância que ocorra

Ele lembrou que a vida é um suicídio diário
E quem não morre também não vive
Nem aproveita o prazer de suicidar-se
De explodir a cada dia como um homem-bomba

Ninguém quis saber disso

Ninguém quis saber de loucuras, sonhos
de um mero psicopata internado
No pior hospício da capital mundial
Se é o que mundo possui capital

Ninguém quis saber que o capital
É o culpado da fome, da preguiça, da TV
Do outono inexistente, do sol mais quente
E da substituição do colorido pelo preto

Ninguém quis saber que um psicopata
Mesmo sendo feio, desdentado e sujo
Também sente necessidade de carinho
E de atenção e também de fazer sexo

Ninguém quis saber que a própria vida
Corria perigo de inexistência
Porque a morte não é mais aceita
E esquecemos de viver pra não morrermos

Com licença, professor

Texto de minha autoria quando mais moço
[ http://p.roney.vila.bol.com.br ]

Eu sou um aluno cearense do ensino médio
Mas não me preocupo com as provas
Nem com vestibular, concursos e notas

O que acho importante é passar de ano
Para não ter que agüentar por mais doze meses
Colégio, chatices e aluno burgueses

Sentar na carteira escolar de sempre
Desprezar os professores, meditar problemas
E soluções e sonhos e fazer poemas

Não agüento mais meninas amostrando
Que sabem algo que pra mim é nada
Que se acham popstars vestindo farda

Queria ser amigo de uma moça forte
Que aos quinze anos à luz da lamparina
Escreve um romance da seca nordestina

Queria ser amigo de um compositor
De um mero rapaz latino-americano
Com sonhos, com sangue, com planos

Queria ser amigo de um menino doido
Que não agüenta mais matérias escolares
E que prefere beber Rum Maré nos bares

Não queria ter amigo nenhum
Queria vagar sozinho e descalço nas praia
Vendo meninas usando longas saias

Queria, ao menos por um momento, ter o dom
De de saber que ninguém manda em nada nem em mim
E sentir o cheiro da morte qual jardim

Eu queria somente ter ao meu lado o vago,
A inexistência de tudo, do sangue, do corte,
Da ferida sem cicatriz revelando a morte

Tenho tempo, capacidade, força, tudo
Eu queria fazer algo pelo mundo
Mas sou um mero aluno cearense e vagabundo

Jardins encantados

Texto de minha autoria quando mais moço sob o pseudônimo João Roberto
[ p.roney.vila.bol.com.br ]

Quero ser um ser interno
De mente inviolável e estranha
Que faz o bem e nada ganha
E fala de um viver eterno

Que vaga sozinho e calado
Dentro da própria alma
E descobre a fonte da calma,
Da paz que é o Bem-amado

Amem-se internamente
No silêncio, sintam o Deus
Que está dentro dos seus
Melhores desejos da mentes

Desejo de acabar com o giz,
Com a álgebra e com os governos
Que não conseguem manter-nos
Sem autoritarismo infeliz

Desejo de amar ao menino
Descalço, de roupas rasgadas,
E às prostitutas coitadas
Que vivem ser ter um destino

Desejo de fraternidade
Sem perder amizade consigo
De sempre se ter como amigo
E buscar a interna verdade

Desejo de colher margaridas
Caminhar em jardins encantados
De sonho, de paz, inventados
Para acalmar nossas vidas

Ah! Quem dera que fosse
Minha vida este vivo jardim
Habitando aqui dentro de mim
Como o sentimento mais doce

Mas o mundo não quer a loucura
De viver a amar as pessoas
De pensar em coisas tão boas
Como paz, alegria e ternura

A última das últimas lembranças

O velho historiento ainda sonha
Com sua juventude maroteira
Quando as maxubas de sua parceira
Eram seios mais firmes que pamonha

Já mais adulto, usava sua fronha
Para esconder a produção inteira
E logo à noite ele ia à feira
Todo janota pra vender maconha

Enquanto o chamam de velho mazorro
A propedêutica das vidas mansas
Ensina a calma diante do esporro

A espurcícia quer entrar nas danças
Por isso marta agora o cachorro
A última das últimas lembranças...

quinta-feira, janeiro 27, 2005

Psicologia de um vencido

Texto de autoria de Augusto dos Anjos, "papa" dos intelectualmente marginalizados

Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme - este operário das ruínas -
Que o sangue das carnificnas
Come e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!

Acrobata da dor

Texto de autoria de Cruz e Sousa, poeta brasileiro filho de escravos

Gargalha, ri, num riso de tormenta,
Como um palhaço, que desengonçado,
Nervoso, ri, num riso absurdo, inflado,
De uma ironia e de uma dor violenta.

Da gargalhada atroz, sanguinolenta,
Agita os guizos, e convulsionado
Salta gavroche, salta clown, varado
Pelo estertor dessa agonia lenta...

Pedem-se bis e um bis não se despreza!
Vamos! retesa os músculos, retesa
Nessas macabras piruetas d'aço...

E embora caias sobre o chão, fremente,
Afogado em teu sangue estuoso e quente
Ri! Coração, tristíssimo palhaço.

Visão de mundo de Cesário

Texto de autoria de Cesário Verde, "um camponês que andava preso em liberdade"

O mundo é velho cena ensanguentada,
Coberta de remendos, picaresca;
A vida é chula farsa assobiada,
Ou selvagem tragédia romanesca.

Eu sei um bom rapaz - hoje uma ossada -
Que amava certa dama pedantesca,
Perversíssima, esquálida e chagada,
Mas cheia de jactância quixotesca.

Aos domingos a deia já rugosa,
Concedia-lhe o braço, com preguiça,
E o dengue, em atitude receosa,

Na sujeição canina mais submissa,
Levava na tremente mão nervosa,
O livro com que a amante ia ouvir missa!

Soneto Satírico

Texto de autoria de Manuel Maria du Bocage, poeta árcade polêmico

Lá quando em mim perder a humanidade
Mais um daqueles que não fazem falta,
Verbi-gratia - o teólogo, o peralta,
Algum duque, ou marquês, ou conde, ou frade.

Não quero funeral comunidade,
Que engrole sub-venites em voz alta;
Pingados gatarrões, gente de malta,
Eu também vos dispenso a caridade.

Mas quando ferrugente enxada idosa
Supulcro me cavar em ermo outeiro,
Lavra-me este epitáfio mão piedosa:

"Aqui dorme Bocage, o putanheiro;
Passou vida folgada e milagrosa:
Comeu, bebeu, fodeu sem ter dinheiro."

Triste Bahia

Texto de autoria de Gregório de Matos, poeta conhecido como Boca do Inferno

A cada canto um grande conselheiro
Que nos quer governar cabana e vinha;
Não sabem governar sua cozinha
E podem governar o mundo inteiro.

Em cada porta um bem freqüente olheiro
Que a vida do vizinho e da vizinha
Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha
Para o levar à praça e ao terreiro.

Muitos mulatos desavergonhados,
Trazidos sob os pés os homens nobres,
Posta nas palmas toda a picardia,

Estupendas usuras nos mercados,
Todos os que não furtam muito pobres
E eis aqui a cidade da Bahia.

quarta-feira, janeiro 26, 2005

Confissão do bom ladrão

Um pardacento e sua hipersemia
Postas nas mãos a sua eloqüência
Ludibriavam povos com ausência
De neurônios por craniectomia

A populaça ignorante cria
Nas tais promessas da incoerência
Já desmentidas pela Mãe-Ciência
Arquiinimiga da antropolatria

Espicilégios de milagres falsos
Para imbeles, ilusos e tolos
No fidalguesco pio livro sagrado

Eu os roubei e não deixei encalços
Melhor servem, eu já notei, se pô-los
Para limpeza da escória do gado

sábado, janeiro 15, 2005

Minha visão do mundo

O padre passa a vida enganado
E ao fim de tudo morde o cianeto
O polonês judeu está o gueto
E o fazendeiro está olhando o gado

O pródigo em seu leito arrependido
Das putas que comeu em noites vãs
Rogando a Deus que bote em seus afãs
A salvação da alma do fodido

Prefeitos que roubam e não são presos
A fome da criança em um reclame
A doce cobardia da madame
Cagando com seus cigarros acesos

Latrinas d’ouro, amores de prata
Os valores desse mundo moderno
Os santos desrespeitando o inferno
E o Satã chupa a ... da gata

Fresquinhos e modelos fazem moda
A lágrima, o sorriso, o tudo, o nada
O Deus, o Diabo, o vadia, a fada...
O mundo é podre e tudo isso é foda!

Epístola à minha amada

Guria dos sonhos meus,

Você é Deusa-rainha
Dos contos da carochinha
A bonequinha de Deus

Por isso, tome cuidado
A malandragem planeja
Te colocar na bandeja
E te entregar prum safado

Falando a bem da verdade
Num tal coluio no bar
Falavam em te roubar
A pueril virgindade

Os lobos que te espreitam
Transformam com jactância
Um bom jardim de infância
Num cabaré e aproveitam

Não sou um pactuário
Desses malditos labregos
Pois são piores que os gregos
E me fizeram de otário

Nesta manhã tão bonita
Eu deixo esse recado
Cuidado, muito cuidado
Com sua sã periquita

Desse ninguém te merece
Foge de qualquer malaca
Se precisar, use a faca.

Garoto que te apetece.

Afasta os lobos quem cerca o curral...

O zeloso pastor cuida do gado
E de lá ele tira seu sustento
Mas temendo que vire alimento
De um lobo esperto e mal-falado
Colocar os bichos num quadrado
De altura tremenda e pouco fina
Com o tronco de um pé de tangerina
Tentou salvar seu gado desse mal
Afasta os lobos quem cerca o curral
Mas esquece as aves de rapina

Um morador com medo das enchentes
Reforçou nas paredes o concreto
Deixou quase a largura de um metro
Tudo pra proteger os seus parentes
Os habitantes da casa tão contentes
Esqueceram o forro e a longarina
E a chuva veio por tamina
Destruindo as telhas do quintal
Afasta os lobos quem cerca o curral
Mas esquece as aves de rapina

A família temendo os ladrões
Colocou travas, grades, cadeados
Ao redor da casa, dez soldados
Vigiam a porta e os portões
Mas ouvindo as salvas de canhões
Para guerra partiram, para a sina
E avistaram do alto da colina
Uma bomba cair na casa tal
Afasta os lobos quem cerca o curral
Mas esquece as aves de rapina

Homem rico vivia solitário
Para que outros homens não tomassem
Seu dinheiro suado e gastassem
Nessas festas inúteis seu salário
Mas caindo feito um otário
Na graça da conquista feminina
Doou de mãos beijadas à menina
Toda a sua receita anual
Afasta os lobos quem cerca o curral
Mas esquece as aves de rapina

Verdades em bordéis

Caveiras apagadas em meu quarto
Lêem a Bíblia já rasgada de meu pai
Os democratas logo no primeiro parto
Abortam tábuas sobre o monte Sinai
Se os gigabytes vêm apavorar profetas
E Alan Kardec reencarna um ditador
Sangrando lágrimas por eleições diretas
Meus dedos podres têm estigmas de flor
Do meu Saara jorra leite com Nescau
Na amargura esfaqueada pelo pó
Até narcóticos suíços no natal
Matam o trato que Labão fez com Jacó
Caras pintadas não resolvem o problema
Poesia práxis é lixo pro concreto
É dessa seiva que nos corre no xilema
Que sugaremos as razões do alfabeto

Não sei dizer
O que eu fui, o que eu sou
Não sei porque
Petróleo se confunde com amor

As mentes submersas nos carbonos
Queimam os pregos que nos prendiam à cruz
As rochas cinzas rompem os seus sonos
E recomeçam o ciclo dos risos azuis
Fadas de botas evaporam no prazer
Com as verdades estampadas nos bordéis
Roubando terços de velhas em Lisieux
São estuprados ao redor de cem mil réis
Sob óculos e lentes de contato
Há indivíduos que não gostam de Moisés
As maquiagens não escondem o fato
As almas vivas gozam ao lavar os pés
Deformando os relógios digitais
O congresso se transforma em altar
Almejando orgasmos e algo mais
Os vagabundos passam no vestibular

Luftwaffe

A porta abre. A luz penetra na casa
De aviadores, senhores amigos
O peito ferve, o sangue em brasa
Abate milhares de sujos perigos
No caderno cheio de histórias
Cabelos brancos, palavras e caças
Refazem os feitos, cospem escórias
Aceitam bolos, refrigerantes e massas
As senhoritas espertas os modos mantém
Apertos de mão doces, suaves
Entre purgantes procuram o bem
Achando anfíbios em meio a aves
O céu? O lugar perfeito, o lar
Onde estão travesseiros de estado
Consola por vezes guerreiros do ar
Mesmo esse tendo por fantasia, o soldado
Em cima da mesa, fizemos as somas
De tantas batalhas que deixou o vento
Olhando estrelas, fazendo idiomas
A lágrima escorre num triz de lamento
Objetos voadores ocultos por vezes
Neste calendário de sóis e de luas
Passeando sozinho por dentro dos meses
Cantam a canção com as cordas suas
Ao final de tudo, ao fim dos confrontos
Espero que nada esse som abafe
Mas sei tudo isso resulta em (dois-pontos)
A nossa querida eterna Luftwaffe

Meu apocalipse escolar

E desce do céu um dragão com duas asas fortes
Uma coroa de três estrelas sobre cada uma delas
Sob os pés duas ilhas desertas
E a saliva de sua ignorância as cercando por todos os lados
Suas sete mãos tentam calar as trombetas
O sopro dos anjos não é um tornado...

Mas quando um Sol soar nas trombetas
Queimando os dedos do grande dragão
Mas quando o leite sair dessas tetas
Da grande mulher, liberdade... O verão
Voltará a brilhar, se jogar no viveiro
E os pássaros todos poderão gorjear
Por cima do templo, o dia inteiro
Como uma panda novinha a brincar.

Mesmo se a trombeta se tornar violão
E a auréola cair sobre a chama do mal
A voz dessa guerra, o rugir do canhão
Não superará o grito angelical.